A Serigrafias & Afins acaba de reforçar a sua coleção com as janelas rústicas do artista Augusto Mota e com a sua obra "Sol Nascente / Loro Sae".
'Loro Sae (e não "Lorosae", pois são duas palavras distintas) significa em tétum Sol Nascente. Foi a denominação que as várias correntes intertimorenses acordaram para o nome oficial do seu país livre da ocupação indonésia.
Até aqui, a denominação era Timor Leste, herança dos tempos da administração portuguesa, em contraponto com o nome da outra metade da ilha, Timor Ocidental, território indonésio.
O regime de Jacarta, por sua vez, chamava a Timor Leste Timor Timur – a considerada 24ª província da República da Indonésia, desde a sua ocupação, em 1975.
Além do tétum (língua nacional dos timorenses) e do português (falado hoje apenas pela minoria alfabetizada e pró-independentista, mas língua oficial de Timor Loro Sae quando for independente), fala-se também a língua do ocupante indonésio.'
Título: "Sol Nascente / Loro Sae"
Técnica: Serigrafia
Dimensões: 44 x 33 cm
Referência: AM0001
P.V.P.: 150 €
Augusto Mota, o olhar do pensamento e a novidade do que é eterno
Autor de cartazes, logótipos e catálogos para várias empresas, Augusto Mota destacou-se nas últimas décadas também na pintura e na escrita. Aos 87 anos, dedica-se aos fotopoemas e às plantas.
Um dos perfis que mais se destaca nas memórias que tenho da minha Leiria dos anos 50 e 60 é o do artista e cidadão Augusto Mota, pelo modelo de pensamento e pelo exemplo construtor de energias criativas que colocou ao meu alcance e de tantas outras pessoas da mesma geração. Licenciado em Filologia Germânica ensinava artes visuais na chamada Escola Industrial e Comercial. Essa aparente contradição sinalizava a abrangência de culturas e de capacidades diversas, numa síntese produtora de entusiasmo criativo e na conceção do maravilhoso da vida como contingência possível. Tive o privilégio de ler muito cedo o notabilíssimo trabalho de tese que fez sobre a obra de Aldous Huxley, numa idade em que o interesse pelo mundo e pela vida tinha consigo a tal crença inicial que acelera a chegada do futuro sem que o facilite, envolvendo-o – não obstante – pelo arco-íris de expectativas plenas de convicção. Desde a utopia franca duma obra como “A Ilha” às perspetivas impiedosas de um “Admirável Mundo Novo”, agora muito mais próximo de todos nós, senti-me impulsionado em direcao a um entendimento da vida e do mundo cujos limites não se esgotaram jamais. Tal como William Blake, cuja obra teve inicialmente como projeto de tese, também Augusto Mota evidencia uma abrangência de criatividades distintas, ao jeito das grandes figuras do humanismo renascentista. Como criador plástico trouxe ao meio em que vive uma grande variedade de sugestões completamente novas, a partir do próprio conceito da condição social do artista como agente de transformações essenciais.
“O futuro não precisa de quadros: precisa de Cidades que os Homens possam habitar humanamente”, disse desde os seus começos, na propensão assumida de rejeitar as atitudes mais formalmente académicas, em benefício de oportunidades abertas ao alcance da maioria. A arte nos objetos e atitudes do quotidiano e na pesquisa sensata e elegante das melhores soluções para todos os problemas da sociedade. Figuras como Augusto Mota deveriam ser utilizadas mais amplamente pela nossa sociedade em seu próprio benefício. O poder e os seus interesses imediatistas têm dificuldade em entender tais valores, o que configura uma das piores tendências da sociedade em que vivemos: a exaltação da trivialidade e a legitimação do que é medíocre.
No último período da sua atividade como professor do ensino secundário (aparentemente, no nosso país só há professores no ensino secundário!…) provou os amargos frutos dum já antigo e hipocritamente escamoteado apodrecimento dos ambientes letivos. Reformou-se dessa atividade em tempo próprio, mas não abandonou a procura de valores e o cultivo de formas específicas de intervenção cultural, de que continuo, felizmente, como espectador privilegiado. Sempre que olho a frescura de inspiração de tantas das suas obras invade-me um entusiasmo poético tão intenso como aquele em que as vi pela primeira vez. Inesquecível é, contudo, o políptico das “Tentações de Dona Urraca”, desenho a traço simples que perfeitamente sugere o universo da cor, pleno de ironia teatral e truculência ingénua que não assustam, antes inspiram quem as vê. Revelação de entidades misteriosamente familiares oriundas dum sonho sem idade, águas impolutas e frescas de um rio sereno sem margens.
Este texto foi publicado na Revista de Informação do SBC, de Março/Abril de 2008
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